Uma nova revolução na saúde provocada pela Inteligência Artificial tem tornado médicos verdadeiros ‘hackers’
Com a pandemia, o uso de tecnologia passou a ser uma realidade cada vez mais presente nos consultórios e na vida dos médicos, em geral. Inclusive, além de consumirem muito mais tecnologia, muitos agregaram à sua rotina, prestação de informações de forma virtual, o que fez surgir desde youtubers, a influencers na área médica. Algo que seria impensável até há bem pouco tempo, por ser uma das áreas do conhecimento considerada das mais convencionais.
Mas, graças ao boom tecnológico, que acelerou a vinda da chamada Quarta Revolução Industrial - expressão que engloba algumas tecnologias para automação e troca de dados entre outros conceitos de tecnologia, durante a pandemia, certamente, será um divisor de águas, no que tange ao médico e suas habilidades.
Com o advento da Inteligência Artificial (IA), por exemplo, surgiram novos mecanismos para realizar consultas, prescrição de medicamentos e diagnósticos. Os médicos se tornaram praticamente “hackers” para ficar mais próximos dos pacientes. Na prática, a IA já tem revolucionado o mercado nos últimos 10 anos, a partir de computadores e processadores mais rápidos, foram introduzidas técnicas de machine learning.
Os tratamentos e consultas passaram a ser feitos à distância com a pandemia e a telemedicina é um dos segmentos que mais evoluiu. É o que mostra uma pesquisa feita pela Global Top Health Industry Issues 2021, organizada pela PwC, 51% das pessoas no mundo fizeram consultas virtuais durante o período. E, com um investimento de US$ 4,3 bilhões no setor no último ano.
É bem fácil de entender a diferença entre Inteligência Artificial e Machine Learning, sendo IA um ramo da ciência da computação que visa tornar uma máquina inteligente como se fosse um ser humano, inclusive na tomada de decisões.
Enquanto o Machine Learning é um subconjunto da Inteligência Artificial, que busca aprender por meio de banco de dados, com desenvolvimento da capacidade de fazer predições diante de novas informações.
Na área de saúde, o Machine Learning tem contribuído muito para apresentar diagnósticos por meio de imagens, com destaque para o seu uso nas áreas radiológicas e dermatológicas, que adotam reconhecimento padrão nos exames e resultados.
De um modo geral, os algoritmos de Machine Learning funcionam tomando por base padrões de reconhecimento de imagem, com resultados qualitativos através dos bancos de imagem e perfil dos pacientes inseridos nestes bancos.
Para entender melhor como funciona, imagine um algoritmo que acerta com precisão o diagnóstico de nódulos de fígado de alta suspeição para câncer e consegue mapear uma população específica, como por exemplo, idosos europeus com cirrose hepática. Assim, também ao ser utilizado em uma população distinta, como asiáticos, vai reduzir a taxa de acerto.
O mercado conta hoje com técnicas diversificadas, desde árvores de decisão, deep learning e neurais networks até tensor flow e reconhecimento de imagens. Atualmente, o principal uso da IA em diagnósticos está relacionado a radiologia, com maior utilização pela área de dermatologia, principalmente para triagem.
Com a chegada dessas tecnologias mais modernas, é possível pensar que o médico do futuro poderia se tornar um hacker de mecanismos de busca. Na verdade, é indiscutível que todo médico hoje que queira acompanhar o mercado não vai precisar chegar a esse ponto, mas terá que ter noções de IA para entender o funcionamento do cotidiano do seu consultório.
Na área da medicina, por exemplo, estas tecnologias são consideradas aliadas no salvamento de vidas, como pode ser comprovado com a criação do primeiro robô cognitivo gerenciador de risco do mundo. De acordo com a publicação mineira, Fonte: Tecnologia da Informação na Gestão Pública, o robô Laura utiliza algoritmos para identificar septicemia ou sepse, popularmente conhecida como infecção generalizada.
E todos sabem que além de contribuir para a revolução na medicina, o aprendizado de máquina também vem sendo aplicado nas áreas educacional, jurídica, do agronegócio, do entretenimento, do marketing e da segurança. Mais que apresentar cases, benefícios e resultados do uso desse campo da ciência tão novo.
Desde final de setembro de 2016, o robô Laura integra a equipe do Hospital Nossa Senhora das Graças, em Curitiba (PR), um dos maiores centros de saúde do estado, referência no Brasil e no mundo pela qualidade em tratamentos clínicos e cirúrgicos de alta complexidade, como transplantes de medula óssea e hepático. A solução utiliza tecnologias de computação cognitiva e é composta por vários algoritmos e por diferentes softwares de serviço, cujo objetivo é montar uma matriz de risco apoiada em uma base de dados de algum paciente ou de um hospital. Trabalha com machine learning, gerando modelos.
O robô Laura é um conjunto de sistemas cujo foco é acelerar a capacidade humana de ler diferentes informações e apresentar os dados necessários para a tomada de uma decisão em tempo real. Ele foi treinado por profissionais do Hospital Nossa Senhora das Graças e por especialistas da empresa de Jacson Fressatto para identificar potenciais pacientes com risco para desenvolver sepse, estudando todos os registros em tempo real (a cada 3,8 segundos). Ao identificar algo suspeito, o robô emite alerta, de modo descritivo, por meio de cores, em uma tela de televisão posicionada na sala da equipe de enfermagem do posto. Essa funcionalidade foi denominada “ansiedade de Laura”.
E a expectativa é clara, esses avanços não devem aniquilar a figura do médico, pelo contrário. Cada vez mais, se faz urgente a figura de um médico híbrido, que entenda da assistência e também da tecnologia. E outra coisa que não deverá deixar de existir, ao que tudo indica, é o trabalho assistencial do profissional de saúde, de continuar cuidando de pessoas. Essa questão do cuidado não vai mudar, ao contrário, vai ser intensificada, pois estando mais próximo do paciente, o médico vai poder conduzir melhor o tratamento fazendo da inteligência artificial uma ferramenta parceira para sua conduta.
Segundo o especialista em tecnologia, Nivio Ziviani, professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e coordenador do Laboratório para o Tratamento da Informação (Latin), do alto de seus 70 anos, diz não temer o avanço tecnológico, quando questionado sobre isso. “Nós, seres humanos, temos capacidade de adaptação absurda. O grande problema é quando as mudanças ocorrem em velocidade muito grande, a chamada singularidade. É o que está ocorrendo agora. Quando há uma máquina alimentando outra máquina, há uma aceleração muito grande na capacidade de solucionar alguns tipos de problemas, e o impacto na sociedade como um todo é muito grande”, afirma.
Para Alan Godoy, mestre em Engenharia de Computação, pesquisador e líder da Plataforma Tecnológica de Computação Cognitiva no Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD), as primeiras aplicações de computação cognitiva e inteligência artificial a captar o interesse geral, surgiram nos anos 1970, com os chamados “sistemas especialistas”, que buscavam transferir para o computador os conhecimentos e capacidades de experts em áreas específicas.
Godoy observa que exemplo disso é o sistema de diagnóstico médico MYCIN, que conseguiu, inclusive, superar os diagnósticos feitos pelos membros da Faculdade de Medicina de Stanford. O engenheiro explica que ele foi desenvolvido para identificar bactérias causadoras de infecções graves, como bacteremia (presença de bactérias no sangue) e meningite, e para recomendar antibióticos, com a dose ajustada para o peso corporal do paciente. Daí a derivação do nome, dos mesmos antibióticos, uma vez que muitos deles contêm o sufixo “-mycin”.
O sistema Mycin foi utilizado para análises de doenças da coagulação sanguínea. Mas a grande repercussão da computação cognitiva aconteceu, em 2011, com a utilização do sistema de computação cognitiva da IBM, batizado de Watson, que conseguiu derrotar dois conhecidos vencedores de um programa de perguntas e respostas da televisão americana, chamado Jeopardy.
Hoje, a plataforma cognitiva da IBM possui mais de uma dúzia de serviços baseados em 50 tecnologias subjacentes. Assim, o Watson consegue analisar imagens e áudio, inclusive de exames médicos, tornando-se uma importante ferramenta na transformação da saúde. No Brasil, a IBM sentiu a necessidade de firmar parcerias para que a tecnologia pudesse ser ensinada já na universidade e para formar profissionais especializados em computação cognitiva. Desde 2016, as instituições de ensino Mackenzie, ESPM e Insper possuem matérias relacionadas ao tema em cursos de graduação, pós-graduação, mestrado e doutorado.
Por outro lado, com tanto acesso à IA, o setor de saúde vem também sendo alvo de ataques de hackers. Quanto mais clínicas aderem às ferramentas virtuais, mais dispositivos médicos ficam conectados e vulneráveis a ataques criminosos.
Em entrevista para a revista IstoÉ, o gerente médico do serviço de telemedicina do Hospital Albert Einstein, Eduardo Cordioli, diz que, em um futuro próximo, teremos dispositivos “hackeáveis” funcionando dentro de nós. O tipo mais observado de vírus para hackear dados médicos são os ransomwares, que criptografa as informações de um computador ou servidor e depois pede um valor para resgate dos dados.
Um exemplo de como esses “cyber criminosos” agem é que eles podem tomar conta de exames como tomografias computadorizadas, assumindo o controle do aparelho à distância e mudar o limite de radiação ao qual os pacientes seriam submetidos. Para coibir tais crimes, o setor solicita que seja adotado um marco regulatório para definir medidas de proteção e que os equipamentos que usam conexão à IA já venham de fábrica com sistemas de segurança empregados.
Na obra “Deep Medicine: How Artificial Intelligence Can Make Healthcare Human Again”, citado pela Science Friday, como o livro do ano, em 2019, relata como um dos principais médicos da América revela como a IA vai capacitar os médicos e revolucionar o atendimento ao paciente.
Em “Deep Medicine” o leitor vai entender como parte da medicina se tornou desumana, com um efeito desastroso. A relação médico-paciente - o coração da medicina - está quebrada: os médicos estão muito distraídos e oprimidos para realmente se conectar com seus pacientes, e erros médicos e diagnósticos errados são abundantes.
No livro, o médico Eric Topol revela como a inteligência artificial pode ajudar. A IA tem o potencial de mudar procedimentos antigos, otimizando os prontuários, exames e diagnósticos médicos, reduzindo a taxa de morte de pacientes. Seguindo o enredo, ao libertar os médicos das tarefas que interferem na conexão humana, a IA criará espaço para a cura real que ocorre entre um médico que pode ouvir e um paciente que precisa ser ouvido.
O livro “A Revolução Digital na Saúde: Como a inteligência artificial e a internet das coisas tornam o cuidado mais humano, eficiente e sustentável”, de autoria de Claudio Lottenberg, Patrícia Ellen da Silva e Sidney Klajner, mostra como a revolução digital é um marco transformador para as profissões que atuam na área da saúde.
Segundo os autores, essa revolução depende de cada um, para que pacientes, médicos, pesquisadores e estudantes de medicina tenham êxito. A inteligência artificial não deve ser temida, mas encarada como caminho para aumentar a precisão de médicos e a segurança dos pacientes.
Ainda de acordo com a obra, o mundo digital permitirá aumentar o acesso da população à saúde, eliminando de forma virtual distâncias que, geograficamente, têm se mostrado intransponíveis.
Ganhos com e-health na prevenção e no combate às doenças crônicas são incomensuráveis. A revolução digital é inescapável e a partir dela será possível um mundo menos desigual e com mais acesso à saúde para todos os seres humanos.
Links pesquisados:
www.pebmed.com.br
www.ipemed.com.br
www.amazon.com.brht
www.prodemge.gov.br